Crise ou birra?
Como identificar, prevenir e agir com crianças com TEA
Assessoria Soulmare Clínica
2/13/20254 min read


Lidar com crises e birras em crianças no espectro do autismo (TEA) é um desafio que afeta famílias, educadores e profissionais da saúde. Entender as diferenças entre esses comportamentos e aplicar estratégias de intervenção adequadas é essencial para promover um ambiente mais equilibrado e respeitoso. Consultamos Laura Guizzo, Psicóloga e Analista do Comportamento na Soulmare Clínica de Autismo, para esclarecer dúvidas e oferecer orientações práticas.
Qual a diferença entre crise e birra?
Uma das perguntas mais comuns entre pais e cuidadores é: “Como diferenciar uma crise de uma birra?”. Segundo Laura Guizzo, essa distinção é fundamental.
“Uma crise comportamental ocorre geralmente como resposta a frustrações, mudanças inesperadas na rotina ou dificuldades em comunicar necessidades. É uma ocorrência intensa e visível, com comportamentos como gritos, choro, agressividade (contra si ou outros) e, em alguns casos, tentativa de fuga. Já uma crise sensorial é desencadeada por estímulos do ambiente que uma criança com TEA não consegue processar de maneira equilibrada, como sons altos, luzes intensas ou multidões. Por outro lado, a birra é intencional e geralmente usada para obter algo desejado, como atenção ou um objeto específico.”
Essa diferenciação é o ponto de partida para aplicar as estratégias corretas de manejo e intervenção.
Existem técnicas de intervenção para evitar crises?
A Análise do Comportamento Aplicada (ABA) oferece ferramentas fundamentadas em evidências científicas para prevenir crises e promover comportamentos funcionais. No entanto, Laura destaca a importância de personalizar cada abordagem:
“Cada criança é única. Antes de implementar qualquer estratégia, é fundamental uma avaliação funcional para identificar a função do comportamento, ou seja, entender qual a intenção ou necessidade por trás daquela ação.”
Entre as técnicas mais eficazes, Laura ressalta:
Previsibilidade: “Crie uma rotina clara e estruturada e informe com antecedência sobre mudanças e transições.”
Controle compartilhado: “Ofereça opções de escolha à criança, como decidir entre dois brinquedos ou atividades, para promover autonomia.”
Modelo de comunicação: “Muitos comportamentos interferentes estão atrelados a uma comunicação pobre. Ensinar a criança a expressar desejos ou recusas, seja por palavras, gestos ou outros meios, reduz a ocorrência de crises.”
Como agir durante uma crise?
Quando uma crise ocorre, manter a calma e priorizar a segurança são passos essenciais. Laura explica:
“Primeiro, observe se o comportamento coloca a criança ou outras pessoas em risco. Remova objetos perigosos, mas evite dar instruções ou ter conversas longas no momento da crise. O cérebro da criança está em ‘modo emoção’ e não ‘modo razão’, e discursos podem intensificar as reações.”
A especialista também orienta a evitar recompensas no momento da crise:
“Evite oferecer algo desejado, como um brinquedo ou doce, para não reforçar o comportamento. Esteja presente de forma acolhedora e, após o comportamento diminuir, ensine formas alternativas de comunicação para expressar necessidades.”
Laura alerta sobre o uso inadequado de técnicas de extinção:
“Deixar a criança sozinha pode piorar a situação. Extinção deve ser aplicada com outros procedimentos e nunca de forma isolada.”
O papel do ambiente na prevenção é importante?
O ambiente pode ser tanto um aliado quanto um gatilho para crises. Laura ilustra com um exemplo:
“Imagine uma criança com hipersensibilidade auditiva entrando em um ambiente com excesso de estímulos sonoros, visuais e demandas. O ‘copinho da tolerância’ dela se encherá muito mais rápido, aumentando a chance de uma crise sensorial.”
Adaptações simples no cotidiano podem fazer a diferença:
Organização e tranquilidade: “Ambientes calmos e com menos estímulos ajudam a criança a se sentir mais segura.”
Rotinas visuais: “Use quadros e figuras para organizar tarefas e informar mudanças.”
Limitação de telas: “Evite o uso excessivo de dispositivos eletrônicos, que podem ser gatilhos comportamentais.”
Como usar a Comunicação Alternativa para prevenir birras?
Dificuldades de comunicação são um dos principais fatores por trás de comportamentos interferentes. Laura explica como a intervenção pode ajudar:
“Trabalhamos o comportamental verbal chamado mando, que é a capacidade de fazer pedidos e recusas. Isso fortalece o repertório da criança, permitindo que ela se expresse de maneira mais funcional.”
Ela destaca a importância de avaliar como a criança se comunica:
“Pergunte-se: ela consegue se fazer entender? Se a resposta for não, buscar auxílio profissional é essencial para iniciar um processo terapêutico eficaz.”
Pontue técnicas de relaxamento no pós-crise
Após uma crise, ajudar a criança a regular suas emoções é crucial.
Laura recomenda estratégias simples e eficazes,
como a técnica de respiração “Peixinho”:
“Peça à criança que coloque uma mão na barriga, inspire pelo nariz
como se estivesse enchendo a barriga de ar e solte o ar lentamente
pela boca, imitando um peixinho
soprando bolhas. Essa técnica ajuda a reduzir
a sobrecarga emocional.”
Outras sugestões incluem ambientes silenciosos, músicas
relaxantes e banhos mornos, sempre adaptados às preferências
individuais da criança.
Qual a importância da família para evitar esses episódios?
Crises frequentes não afetam apenas as crianças, mas também seus pais e cuidadores. Laura ressalta a importância do treinamento parental:
“Famílias que enfrentam crises constantes relatam sentimentos de desesperança e exaustão. O treinamento parental capacita os pais com técnicas práticas, como o BST (Behavioral Skills Training), para gerenciar comportamentos de forma mais assertiva e menos reativa.”
Esse suporte promove não apenas o desenvolvimento da criança, mas também a qualidade de vida de toda a família.